em busca do verso
a elegia datada
Em memória de Haroldo de Campos, inventor.
o homem desta manhã
nos olhos fundos
de cada um
no mundo do olho
de cada um
que pudera
no orvalho
que insiste
no triste
ovo que gera
mostra o mundo
da palavra mera
o homem atrás
do pano de fundo
no limoso poço
– cratera
olhar profundo
nos olhos tristes
e corcundos
a dor jacta:
a dor da era
olhar santo
de tanto fundo
que na pele atraca
a funda espera
a fome e o planfeto
que se leve avante o levante ante
essa coisa de fome de quem não come
de quem não consome e se consome e some
ou fica no mundo ou fica vagabundo
ou se desfaz e não faz se não se faz
pois consegue que um todo negue
a importância e a ãnsia da bravata do lula de gravata
que o mercado acha que ata que o banco atarracha
e usa o riso e usa o siso a imprensa e prensa
a todos que querem que o levante
não se esfomeie irrelevante qual estrela cadente
falar nisso cadê o dente?
quem tem medo do homem nu?
para Wladimir Herzog
a foto do fato do homem tratado no porão como rato
na pele pela dita ditadura
que forja suicida e dor sem atadura
cala o gesto
a pena
a fala
e leva à vala
tritura
ama da dor intátil à torpe tortura
mas amador líder a delir o delírio ufano
tripudia a (s)chibata do insano
(o nó do peito: regar do fedor da dor do nada feito ao feitor)
revivescente
remoer a ferida
retirar a tala
o que atenua
o viver em vão
na vida sentida
se o sofrer cala
a poesia crua
arranca um não
no alto da vida
(aonde a dor se instala)
o clarão da lua
banha meu coração
a briga
na rua
a lua
crua e nua
anuncia
um eclipse
na tua
psique
carcará
o canto do João
do Vale
vale tanto
que o tanto
é pouco
e um poco
santo
roberterasmo
”e que na minha idade
só a velocidade
anda junto a mim”
encanto
lua
olhar
rua
luar
arder
nua
luaridade
mote na morte do haroldo
um mundo a cada atómo num segundo a cada mundo num átimo envelheço no mundo
que meço eletronizado cada passo no espaço strangeletizado o aço das cinzas de um laço
do recomeço
pohemeto sonoro para cantar em qualquer andamento
ao mago Hermeto Paschoal
o tudo toca
o nada canta
a toca toca
toca e canta
até pato toca
e o mato canta
a corrente
a falada pá de cal sobre o visionário
dos versos com jugo o calvário
ó grilhão ao abecedário
em troca do catecismo
ao dinheiro do egoísmo
ds conversão que o prazer acorrenta ovaciona
todo aquele que deveras teme um outro lado
que a vida tem
revigorar
re vidar re tirar re mover
tal e qual o total do mal
da fala da sala e do sal
quatro
a tarde a chuva a janela a vida
a vida da janela na chuva de tarde tarda a vida
na chuva da janela a janela da vida
na chuva de tarde a chuva da janela
da vida de tarde a vida é tarde
é janela a chuva é vida
a vida sopra a vida morre na tarde
(enquanto isso lá fora a chuva e a tarde
se enamoram por um canto de jardim
cá a janela introduz na vida
como um novo amor o olhar
por fim o olhar e o jardim
cumpliciam-se com a tristeza do ocaso)
o dízimo
a sacola passa
e ultrapassa
a massa
a seita cresce
e escurece
a messe
a plebe
submissa
purga omissa
a sacola cresce
e ultrapassa
a seita
e escurece
submissa a plebe
omissa
purga
a messe
e a missa
passa
poética 1
mate não tema
anátema
da gema
mate não
aparte
arremate
o lema
mate não
clame
chame o fonema
embate o tema
poemate
sexo
não pode evitar meu olhar no seu olhar
meu olhar nos seus olhos
meu olhar nas suas recusas falsas
não pode evitar que me olhe
e que meu olhar atinja por teu corpo inteiro
primeiro o que vê depois a gangrena em seus pudores
não pode permitir que meu olhar vá embora
mas hesita teu olhar para o nada
um jornal
um poema
um não-objeto
nessa eternidade que abandona em todo seu âmago em todas suas febres
em toda sua insanidade
não pode você deixar de me amar
mas você não pode me amar
o quanto seus olhos decretam
somente o olhar amalgama suas dores
em busca do verso
prenuncie a letra pronuncie o nome
a palavra profetize
arrume a rima reme
em rumo da não meta
a metáfora fora de uma cor
rente à corrente da vaga
que surge a grave que supre
a suprema forma de canto
qual santo acalanto
poetize
sempre
poetize
quando
poética 2
me caço
sem laço
não me acho
nem em cima
nem na rima
nem em facho
me calo
no embalo
de quem fugiu
– vassalo
e dormiu
quando o sol surgiu
no gargalo
e ruiu
num pequeno
estalo
a eterna paisagem
o país dos penitentes dos sem-dentes
dos sorridentes da panela vazia
da vã alforria da lenta agonia
da favela trincheira
do eira nem beira
da xepa da feira
o poder que assola
a falta de escola
do governo esmola
que se travestem de humanos
mas que cada um é pro seu
que se atura como nomenkletura
tudo mesmo os eternos com seus ternos
que ganham reganham
dos que estão em versos lá em cima
logo acima que ensina que a flor fina na surdina
é pedra e medra do crivo de que tem o arquivo
que foge da raia dos ossos do araguaia
da sonhadora povoador terra do se terra
que berra que morro mas cerra ao ver s novela
que encerra no peito no leito da pátria varonil
juvenil do céu anil da puta que o pariu