Nada cessa o filme vida.
Nem a bomba atômica nem praga
Do Deus enérgico, da ira que soçobra.
A vida não é só a vida vivida, os fatos,
O dia, noite. Nem o gozo em arfadas.
(Inda há pouco dei vida
A Capitu regenerando seu rosto
Das entranhas de suas sílabas,
Solfejadas em compassos ternários
E altissonantes)
A vida preexiste no desejo de se criar
Novas vidas, granjeando encontros.
O amor se põe a sonhar; dobramo-nos.
Por vezes, por acidente biológico,
Nas vontades mais proscritas. Outras,
Sem cultivo, na orquídea da surpresa.
E no quando desgarrado da inocência,
Damos corda à vida que nos despeja
Do presente, ao convívio nefasto
Com os túneis e fímbrias do passado.
A vida da cachoeira morta
Pelo homem vive naquilo que a represa:
A fotografia eterna.
E os bandos de pássaros passam
Em tantos para que se note que são tantos.
A vida segue clara depois da morte,
Por perto da ausência, cultuada no ar
Ou nas lajes frias como o lamento triste
Do jovem imorredouro, o condoreiro.
(Quero a imolação pelo fogo, cinzas rápidas,
Que ainda quentes sejam doadas ao vento meu,
Amigo de vida fremente em muitas estrofes)
A vida é o todo de tudo, o mundo no plural.
A vida é assim, muito além do que se respira.
A vida sempre circunda o tempo, beija, ri dele
E o subverte. A vida, enfim, não tem fim.